Economia | Os impactos e elementos da Crise de 2008 no Brasil
Questões norteadoras — Prova de Economia Internacional e Comércio Exterior para a Universidade Veiga de Almeida.
Não encontro aqui o comando dessa prova, feita em 2020, de Economia Internacional e Comércio Exterior para a Universidade Veiga de Almeida (UVA). Mas o texto abaixo evidencia a proposta: analisar criticamente três textos, de três autores diferentes, para o Jornal dos Economistas, sobre os impactos e elementos da Crise de 2008 no Brasil. Os textos de apoio estão no fim do texto.
O conteúdo a seguir é consequência do meu olhar sobre Economia, ciência que estudo (sempre de forma multidisciplinar) há mais de 10 anos e de forma bastante ampla, em todas as suas vertentes, sem preconceitos. A nota de avaliação foi 10/10.
As três análises do Jornal dos Economistas apresentam um ponto em comum: uma avaliação condescendente com o desempenho do governo brasileiro na contenção da Crise de 2008. Esta “Bolha” foi provocada por uma especulação imobiliária inconsequente — ou, no caso, consequente da desregulamentação do mercado financeiro estadunidense. O livre mercado permitiu que os grandes banqueiros faturassem milhões com o repasse adiante de títulos podres, haja vista que pertenciam a clientes sem liquidez para quitar seus débitos de imóveis inflacionados.
Luiz Filgueiras, é pontual em sua análise de quais seriam as portas de entradas da Crise de 2008 no Brasil no texto 1, “Os efeitos da crise
econômica mundial na economia brasileira”. A primeira se baseia na natureza do mercado financeiro, suas desregulamentações e volatilidade, assim sendo uma observação mais óbvia e que não demanda maior explanação: sim, os mercados oscilaram como era de se esperar, ponto. O segundo elemento analisado por Filgueiras que mais surpreende: a previsão precisa de que o Brasil sofreria com a queda do preço das commodities.
À época, o Brasil surfava uma baita onda de preços altos de suas matérias-primas. Naturalmente, se esses preços caíssem, o país sofreria um impacto em sua balança comercial. O que o economista não prevê é que Dilma Rousseff seria tão infeliz em suas medidas de contenção da crise prevista. Vide seu plano de renúncias fiscais — tão podre quanto o “subprime” dos títulos imobiliários que provocaram a Crise de 2008.
Renúncias fiscais são como qualquer outro investimento: só se põe dinheiro se tiver contrapartida. O problema é que o Governo Dilma concedeu centenas de bilhões de reais de renúncias fiscais para empresas que não ofertaram qualquer contrapartida ao erário brasileiro — como, por exemplo, uma geração de empregos que aquecesse a atividade econômica do país ou a oferta de um serviço importante para a população.
O que restou foi um prejuízo imenso, pois um gasto injustificado (dos pontos de vista lógico e ético) e sem retorno. Haja vista que grande parte das empresas beneficiadas eram, além de tudo, saudáveis, não precisavam de tais renúncias para manter seus negócios. Ao contrário de tantos empresários menores que faliram no mesmo período, e teriam uma sobrevida caso o BNDES cumprisse seu papel de investir no desenvolvimento econômico e social do país.
Surpreende ainda a competência do professor Luiz Filgueiras em constatar que a falta de diversidade e de valor agregado das exportações brasileiras afetariam o país durante a crise. É, coincidentemente, o diagnóstico feito por Ciro Gomes durante as eleições presidenciais de 2018, e a base do (bom) receituário nacional-desenvolvimentista apresentado pelo candidato à ocasião.
No texto 2, intitulado “Crise econômica: daqui para onde?”, Luiz Fernando de Paula percebe um paradoxo na economia brasileira após a Crise de 2008: que a queda do dólar coincidiu com um processo de desindustrialização do país. Hoje é notável que isso ocorreu porque investir na indústria e na geração de empregos se tornou menos rentável que comprar títulos públicos brasileiros, já que a taxa de juros ultrapassou os 14% — um patamar nada convidativo para investir em empresas e muito atraente para aplicar no Tesouro do Brasil, que era e ainda é um bom pagador. Apesar disto, essa lógica já não existe mais, pois os juros brasileiros se encontram, em 2020, em seu ponto mais baixo da história, de 2% ao ano.
Economia muitas vezes se enquadra na lógica do wicked problem: algo tão complexo que cada medida adotada gera um efeito colateral. É o caso das medidas anticíclicas adotadas pelo Governo Federal brasileiro naquele momento pós-crise, em outubro de 2010: num primeiro momento, a alta dos juros conteve a fuga de capitais; mas, no seguinte, impactou a atividade econômica brasileira. Assim são as medidas paliativas: aliviam apenas momentaneamente. Para superar um problema crônico, são necessárias intervenções mais profundas, mesmo que de médio a longo prazo.
Curiosamente, o Professor Filgueiras antecipa esse problema e apresenta a solução no texto 1, publicado quase 2 anos antes dessa decisão do Governo Lula: que a indústria brasileira seria menos suscetível a crises internacionais se fosse mais diversificada e produtora de itens com maior valor agregado. Em sua visão, era urgente um investimento do Estado brasileiro em sua atividade econômica, de modo a aumentar sua pujança e variação, mitigar sua dependência da participação privada (que pode migrar para o mercado financeiro quando lhe convier, o que ocorreu nesse período) e sua necessidade de importação de itens de maior valor agregado — muito pelo contrário: assim transformando o Brasil num exportador de produtos mais caros. Tecnologia não falta, o que falta é investimento no desenvolvimento da indústria nacional visando ao futuro do país.
Por fim, no texto 3, “Agências de Classificação de Risco: Cui Bono?”, o economista Adhemar S. Mineiro questiona a credibilidade das agências de classificação no mundo. Que são só três, e pelo menos duas delas têm participação no mercado financeiro e interesses próprios em mudar (e lucrar com) tais classificações. Como ele bem observa, a Moody’s e a FIMALAC arbitram o jogo que elas próprias também jogam, o que põe em xeque a imparcialidade de empresas tão importantes no jogo econômico global. A desconfiança de Mineiro ganha peso diante dos recorrentes erros dessas agências e do perfil dos beneficiários de seus grandes erros: os banqueiros, os multimilionários, os megaespeculadores.
Em termos de parcialidade, porém, a crítica mais pungente de Adhemar S. Mineiro recai sobre a grande mídia brasileira. O articulista nota o abismo que havia entre o anúncio da Moody’s de que a avaliação do Brasil poderia cair (e para um patamar ainda positivo) e o peso dado pela imprensa. Não só hoje, como no momento da publicação do artigo (às vésperas da eleição de 2014), era muito claro a todo cidadão crítico que os grandes veículos de imprensa tomavam partido em favor do candidato Aécio Neves, que representa os interesses econômicos desses grupos midiáticos.
Acentuar a “perspectiva negativa” da economia brasileira era um modo de atacar o governo da presidente Dilma Rousseff, que disputava a reeleição, venceria o pleito e, anos depois, seria derrubada. O impeachment de Dilma foi todo envolto em um processo muito escuso, com todo jeito de golpe branco, porém teve o apoio irrestrito dessa mesma mídia. Essa postura, parcial e antiética, é algo histórico. Os ditos “jornalões” saem sempre em defesa da alternativa neoliberal na disputa pelo poder político no Brasil.